Recuperação.


E aqui estou eu, de volta, após um quase um ano. Desde Maio, que deixei de escrever aqui no meu cantinho, desde Maio que me fechei, desde Maio que isolei toda a dor, bem dentro do coração. Tempos difíceis, tempos bastante difíceis. Houve alturas em que a dor me consumiu tanto e cheguei a pensar que não iria conseguir chegar ao fim. Houve alturas em que tinha até medo de adormecer e não acordar mais. Houve alturas em que quis realmente, que isso acontecesse. Muito poucas vezes. Um dia, não sei bem quando, a dor passou. Deixou de existir, ou simplesmente ficou esquecida. Um dia, acordei e não a senti mais, não senti o coração nas mãos de cada vez que aproximava de alguém. Não senti a respiração ofegante, como quem tivesse acabado de correr. Não senti os olhos pesados, nem tão pouco a alma congelada. Naquele dia, não sei bem qual ao certo, voltei a ser eu. Voltei a ser a menina do sorriso rasgado a que todos se habituaram. Voltei a ser a menina das palavras envolventes. Hoje aqui estou eu, recuperada daquela overdose de (des)amor que me destruiu dias após dias, durante meses. Aqui estou eu, de alma altiva, de sorriso posto. Aqui estou eu feliz e um pouco mais fechada e arrogante para as pessoas. 

21:32

Passaram dois meses. Dois meses desde a última vez que estive perto dele, que o olhei nos olhos, que senti o cheiro dele. Dois meses desde a última vez em que o vi afastar-se de mim. Não houve sequer um adeus, e no meio de tudo, foi isso que mais custou. O nem ter dito adeus. Ter ido embora, sem sequer invocar um miserável adeus. Passaram dois meses e eu ainda sinto o coração a bater forte quando se fala nele, de como está agora, da vida que agora leva. Passaram dois meses e eu ainda me lembro dos olhos dele, das bochechas dele, das sardas dele, e do cheiro que emanava sempre. Do cheiro que eu adorava e que fazia questão de salientar. Cinquenta e nove dias, sem o ver. Quarenta e oito dias, sem lhe dizer uma simples palavra, nem um olá. Nada. Perdemo-nos tanto um do outro. Perdeu-se tudo. Ficou a apatia, a mágoa, a indiferença. Fiquei eu. Com o coração vazio. Fiquei eu. Vazia, arrogante e principalmente, fria.

14:15

Acordas, levantas-te uns minutos após teres ponderado inúmeras vezes, ficar na cama durante aquele dia que, à partida, já saberias ser um verdadeiro tormento.Vestes a tua melhor roupa na esperança de que isso te faça sentir um pouco mais segura e mais confiante. Metes-te debaixo do chuveiro, tomas o pequeno almoço, lavas os dentes, olhas para o relógio e já estás completamente atrasada. Estás sempre atrasada. Sais de casa e está um tempo horrível, a chuva parece que veio para ficar, o que até se identifica minimamente contigo. Mais um dia, mais um turbilhão de emoções, mais uma imensidão de sensações, algumas das quais desejas não sentir. As pessoas nunca vão perceber o caos emocional em que te encontras, pois não querida? As pessoas vão continuar a achar que agora sim, estás realmente feliz, sem sequer desconfiarem que toda tu és confusão, que toda tu és caso mal resolvido. Ele ainda te atormenta, noite após noite, quando te invade o sono, quando se infiltra no teu ser e te destrói de minuto em minuto, sem pedir permissão, sem qualquer piedade, sem sequer te dirigir um pedido de desculpas por mais cínico que seja. Eu sei que tudo isso ainda te dói querida. Ele ainda aparece constantemente no teu pensamento, quando passas por todas as ruas que se tornaram um pouco vossas, por terem sido palco daquilo que julgavas ser amor. O que mais dói, no meio de tudo, não é a dor do abandono mas sim aquela sensação de ilusão que agora te percorre a mente, quando o nome dele é pronunciado numa das esquinas da cidade. Eu sei que dói querida. Eu sei.

1*

Já tinha saudades de escrever aqui. De poder descrever o que sentia, sem que me interrompessem a meio caminho e me dissessem que isto é errado. De poder usar as palavras para explicar o que sinto.
Há pouco mais de um ano, quando me disseram que eu iria ser capaz de encontrar alguém que me entendesse e que me aceitasse como sou, eu achei tudo aquilo impossível e impensável. Como me poderia eu apaixonar por outra pessoa, senão por aquela que me roubava o sono todas as noites e que me deixava sempre à beira de um precipício? Como podia eu entregar o coração a outra pessoa, quando ele se encontrava completamente aprisionado àquela imagem que eu tinha de "amor da minha vida"?
Tudo aquilo era tão desumano, que eu sempre o negava. Jurava a pés juntos que nunca iria acontecer, que eu não seria capaz de trocar alguém assim, de substituir alguém assim. E o que é certo é que, sim, um dia apareceu uma pessoa. Uma pessoa que me despertou diversas emoções e que me fez voltar a acreditar no "amor" propriamente dito. Uma pessoa que quando me abraçava, parecia que o mundo deixava de existir. Uma pessoa que me fez acreditar que embora as pessoas nos magoem, há sempre outras tantas no mundo capazes de nos consertar. Uma pessoa que se tornou tão única e que eu sempre me recusei a largar.

Nem tudo era um mar de rosas. Era uma pessoa bastante complicada, incapaz de amar alguém, de permanecer com alguém, o que gerou muitas confusões. No entanto, tinha um coração enorme que mais tarde se abriu para mim e para o meu amor. Tivemos tempos bons, tivemos tempos complicados. Houve alturas em que me sentia a pessoa mais amada do mundo. Houve momentos em que me apetecia bater-lhe com todas as minhas forças. E embora, nem tudo tenha sido bom, foi a pessoa que me abriu os olhos para a realidade. Que me fez mudar, que me fez crescer ainda que, da pior forma. Foi a pessoa que, nalgumas vezes me levou à exaustão, que me deixou completamente sem rumo, e da qual, ainda continuo a gostar. Passou pouco mais de um ano após o ter conhecido, e embora tudo tenha terminado há pouco mais de uma semana, ainda continua a ser a pessoa que me aparece todas as manhãs no pensamento. Que me faz pensar que a vida não é um mar de rosas, mas que também não é má de toda. E que, apesar de todas as más atitudes, de todas as discussões e de as coisas não terem acabado da melhor forma, o amor continua bem dentro do coração. Que apesar de ter acabado, o amor permaneceu. Que apesar de sentir falta, pelo menos já não dói. E a isto eu dou o nome de amores bonitos. De amores que nos sufocam no fim, e que ainda assim continuam a ser amores.

Tell me.

E quando te vês obrigado a esquecer, a deixar, a abandonar? A desistir. O que fazes? As noites continuam a ser do mesmo tamanho, os dias continuam a ter o mesmo sabor? As horas passam mais rápido ou cada vez mais devagar? Consegues dormir? Consegues adormecer sem o peso na alma? Sem uma vontade enorme de pegar num x-acto e cometer qualquer acto suicida que te acabe com a dor, com o peso, com a dormência, com a vontade de chorar? Consegues dormir, sem em qualquer momento desatares a chorar, sem saber muito bem porquê? O teu coração continua intacto, solto, desprendido de qualquer sentimento, ou nem sequer o sentes? Não sentes sequer a dor, o sufoco na garganta, as pernas a tremer de tanto medo? Medo do que se aproxima, do que ainda está para vir. Não sentes medo? Não sentes a respiração mais pesada, mais forçada? Não forças o riso? Não forças a vontade de rir, puxando-a do mais fundo de ti, para que tudo pareça eventualmente um mar de rosas? Não dás a entender que és a pessoa mais feliz do mundo, para evitar as habituais perguntas que tanto te chateiam e que tu não consegues responder? Não choras todos os dias em silencio, num recanto, sem que ninguém te veja? Não há um único dia em que deixes de chorar, de te martirizar, de dizer que esqueces e no final só lembras ainda mais? Não há um único dia em que  gritas em voz alta que tudo vai passar, que o tempo é o teu amigo, e que a dor se cansará? Não há um único dia em que consigas ser optimista e dizer que estás bem, ao ponto de todo o mundo te ouvir? Vá, diz-me que não sou a única a sentir isto. Diz-me.

Wild horses, I wanna be like you.

Já não sinto revolta. Apenas um vazio do lado esquerdo, que me deixa sem ar de cada vez que o teu nome é pronunciado. De cada vez que me perguntam como estás, e eu sou obrigada a dizer que não sei, porque de facto não sei. Não sei se estás bem ou mal. Perdemo-nos um do outro, e é algo que já não é de agora. E custa. Custa muito. Mas já custou mais. Já chorei dia e noite. Já me senti a pior pessoa do mundo. Já te quis dizer de mil e uma formas que o teu lugar é comigo, porque juntos somos a combinação perfeita e separados somos apenas duas metades. Já quis ir ao teu encontro e dizer-te de todas as formas que somos um, que seremos sempre um, e abraçar-te. Abraçar-te até me doerem os braços, até o coração deixar de bater, e até as minhas pernas se cansarem. Já te quis dizer que sem ti sou como uma escala musical sem notas. Já te quis dizer que apesar de tudo, foste o único que me deu a vida, que me devolveu a felicidade. Já quis. E ainda quero. Mas não me sinto com coragem. Tudo isso seria em vão, e eu já não aguento os estilhaços a baterem-me no coração e a deixarem-me cada vez mais sem vida. E agora vejo-me obrigada a dizer adeus a tudo o que algum dia foi meu. A todas as pessoas que se tornaram um bocadinho minhas e a tudo o que senti de coração aberto. E dizer adeus a tudo, é tão difícil.
Eu sei, por mais que tentes disfarçar, o que te custa é que eu esteja a conseguir sorrir sem ter que me esforçar. Eu sei. O que mais te custa, é veres-me a seguir em frente e ficares, tu, preso ao sentimento que nunca sentiste. Dói, não dói? Detona-nos por dentro e ainda nos tira o sono. Eu sei. E de facto, não tenho pena de ti.